A vida nos proporciona momentos incríveis e amigos memoráveis. Em meio a essa prisão que estou pagando sem dever, sinto uma saudade perpétua das minhas amizades, do convívio retirado há mais de ano. E quando me alembro dos que partiram sem ter combinado? Aí a lembrança me apunhala profundamente com o gume da saudade. Em 2017 meu querido amigo Barbosa nos deixou. Pessoa de inteligência, generosidade e alegria incríveis.
Oriundo de terras caririzeiras, dos confins da zona rural do município de Aroeiras, ainda na adolescência resolve ganhar o mundo; imbuído do espírito tenaz na busca de dias melhores, Barbosa vai para o Rio de Janeiro nos anos de 1960. Vai pra voltar, como Roberto Carlos, mas não voltou... A não ser a passeio. Em terras fluminenses casou, teve filhos e constituiu sua vida, “Rio de Janeiro bota um visgo na gente”, já dizia Luiz Gonzaga. Em uma de suas vindas à Paraíba nos conhecemos e, em alguns minutos já conversávamos sobre tudo que havia nesse mundo (e nos outros!) de modo que mais parecia que nos conhecíamos há vários e longos anos.
Barbosa era um otimista de carteirinha, vibrava emotivamente com o sucesso de seus conterrâneos, aqui na Paraíba sempre falava do que via e ouvia de sua terra lá no sul através da imprensa, de políticos a paisagens naturais e sempre me perguntava pausadamente: “– Ô Thomas, vem cá, como é mesmo esse negócio? o Lajedo de Pai Mateus é aquilo tudo que vi na televisão?” e ali eu estava como consultor do homem que, longe de sua terra, amealhava as fagulhas de seu lugar para se sentir bem. Já dizia um velho jargão que o homem só é feliz vivendo no lugar que nasceu e ele tinha planos para voltar. Esse sentimento sempre o motivava a pegar um avião e visitar sua família em Campina.
Na Paraíba, mais precisamente em Campina Grande, ficava sempre hospedado na casa de sua irmã, Dona Severina Barbosa (mãe de minha querida amiga Joana D’Arc), esposa de Seu Antônio e que em alguns momentos não sabíamos de qual dos dois Barbosa era irmão, tamanha afinidade. Ali ele se sentia bem, em casa, rodeado de dezenas de sobrinhos e netos, era venerado por todos. Sua presença estava sempre envolta em um halo de luz, sua energia contagiante não nos deixava fazer outra coisa a não ser estar ao seu lado concorrendo com seus familiares.
Algumas vezes o levei para passear, certa vez fomos à Pedra de Santo Antônio (em Fagundes), não só o monumento religioso o encantou, mas a paisagística serrana o deixou atônito. Lá em baixo, no horizonte, Campina Grande repousava à sombra de algumas nuvens. Confesso a vocês, caríssimos leitores, que passei pela primeira vez pela fenda da Pedra naquele dia. Ele me incentivou. Eu estava vestindo com camisa branca de algodão e temi sujá-la por completo, mas aceitei o desafio. Reza a tradição que ao passar por três vezes pela fenda, o Santo casamenteiro dava uma forcinha no casório, apresentando em breve a pessoa amada. Pois bem, em dia de quase nenhum movimento e não conhecendo o rigor do trâmite, passei pela abertura, mas no sentido contrário (Deus meu, será que é por isso que até hoje não casei?) e ainda passei só uma vez (curiosamente a camisa ficou intocada).
Lembro que no meio do ano de 2016 Seu Barbosa veio com uma de suas filhas, esposa e irmã para sentir de perto os festejos juninos, comentou com alegria o livro que fizemos sobre a História da Associação Comercial com fartas imagens antigas de Campina e que enviamos para ele. Trouxe na bagagem um livro sobre a Petrobrás e, ansioso, nos apresentava com motivação. O último aperto de mão, o último abraço foi quando se dirigiu ao Recife para visitar uma de suas sobrinhas e pegar o voo de volta para casa. “ –Até breve Thomas!”, “– até meu amigo!” respondi.
Sua história de vida é admirável, sua alegria contagiante e sua generosidade foi tanta que resolveu partir num momento em que toda a sua grande família se unia em energia positiva e oração para o reestabelecimento da saúde de sua sobrinha e nora que, vítima de um atropelamento, estava em coma e com fraturas no Hospital de Trauma em Campina Grande. Seu filho e braço direito, o Adriano Barbosa (esposo de Mary), emocionado me disse: “– foi embora um fanzão teu Thomas...” e eu pensando: “– poxa, o fã sou eu!” assim como o era todos os que o cercavam.
Barbosa saiu de cena discretamente, escolheu partir sem despertar a dor. Dias depois a família vibrou com notícias positivas de melhora da Mary Barbosa, um verdadeiro milagre da vida, contrariando o que diziam os médicos. Na memória, Barbosa nunca será sinônimo de tristeza ou de sofrimento, nem mesmo em sua partida e hoje recordo sua cordialidade, quanta generosidade velho amigo!
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Publicado na coluna 'Crônica em destaque' no Jornal A União de 08 de maio de 2021.
Mais ums de suas crônicas maravilhoas👏👏👏👏💕