POR SE TRATAR da terceira cidade mais antiga do Brasil, João Pessoa possui um imponente patrimônio histórico revelado em seus casarões, prédios, praças e igrejas de seu centro antigo. O traçado urbano do epicentro velho da cidade revela as feições pretéritas de uma cidade de grande importância. Sobressaltam dentre as edificações antigas alguns becos e vielas históricos que a tempos de hoje ocultam parte da boemia e de uma intensa vida profana da capital paraibana. O Ponto Cem Réis vem ser a concentração, onde reúne toda sorte de gente para os mais diversos fins durante todos os dias, noites e madrugadas, é bem verdade que ele não é mais o de outrora, mas sua condição central impõe encontros.
Este epicentro antigo oculta em seu subsolo uma grande riqueza histórica, são objetos e fragmentos que foram ao longo dos séculos se acumulando e testemunham páginas do passado da capital. Atendendo a este patrimônio oculto no subsolo, há 15 anos, estive integrando uma equipe que realizou uma atividade de salvamento arqueológico que consistiu no acompanhamento das obras de escavação para a introdução de dutos subterrâneos para linha telefônica. No momento em que se cavava as bordas das ruas mais antigas, observávamos o aparecimento de materiais que pudessem “falar” sobre o passado do lugar. Assim, passamos vários dias neste mister.
A experiência de acompanhar estas obras dotou-nos de um conhecimento não só da dura vida de trabalhadores braçais como também pudemos conhecer figuras hilárias e folclóricas que bailam nas sombras da madrugada pessoense, de bar em bar, de cabaré em cabaré, de beco em beco, que, esparsos no Centro Histórico, dão uma aura bucólica à madrugada e só os antigos prédios históricos testemunhavam as peripécias de seus frequentadores.
Como a obra impreterivelmente interromperia o trânsito urbano de uma área central (e isto não era conveniente!), o empreendimento se desenrolou em sua maioria à noite/madrugada (das 7h da noite às 5h da manhã) e neste momento, passávamos a dividir a rua com os trabalhadores e transeuntes noturnos, estes, pregando verdadeiras peças aos trabalhadores (e a nós, também): prostitutas que se ofereciam e eram cortejadas, boêmios que ofertavam bebidas, menestréis que cantarolavam sozinhos em busca de suas inspirações, homens perdidos questionando onde seria o cabaré ou bar mais próximo, etc. Tudo isso parecia acalentar um pouco a dura rotina, fazendo com que o grupo servil pudesse, em momentos, sorrir e se deleitar.
O trabalho funcionava tecnicamente da seguinte forma: para abrir valas (com 0,30m de largura e 1m de profundidade) ou poços (quadrados com 1,80m de profundidade e 2m de largura), dois trabalhadores (em cada trecho) se revezavam em um único lugar. Primeiro a grossa camada de asfalto era retirada a partir de golpes de marreta ou com o britador elétrico. Em seguida, a camada de paralelepípedos era vencida a partir dos duros golpes da marreta, que descolava os blocos paralelos, abrindo caminhos para os escavadores; aí eram dois: um que batia com a picareta o sedimento e outro com a pá retirava a terra solta.
Por vezes, o trabalho fora interrompido por tubulações d’água que eram rompidas. Vinham então a salvadora figura dos consertadores de cano, um daqueles artífices que tinham a técnica de emendar a tubulação no escuro, sem iluminação, baseando-se apenas no tato e conseguindo exercer este difícil mister rapidamente.
Durante toda a trajetória até o último centímetro cavado, nós da equipe estivemos atentos a tudo, a cada picaretada, a cada pá de terra que saíra dos buracos. Ficávamos de prontidão andando de um lado a outro, portando uma lanterna, observando atentamente aquele sedimento e preparado para o possível aparecimento de material arqueológico que pudesse efetivamente testemunhar, nos dizer como era o cotidiano da capital paraibana em outrora.
Assim foi acompanhar a obra, observando, registrando, fotografando e escrevendo sobre todo o material coletado, contribuindo com a elucidação do passado e conhecendo com detalhes a madrugada deste que é um dos aglomerados urbanos mais antigos do país.
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Publicado na coluna 'Crônica em destaque' do Jornal A UNIÃO em 14 de agosto de 2024.
Paciência e expectativa.
Thomas Bruno
Por falar em Ponte Cem Reis, eu pela minha idade, cheguei aqui no ano 1950.Vi as transformações por que passou primeiro a linha do bonde e um abrigo onde vendia passagem que sendo construído outro, no governo de Oswaldo Pessoa, os dois foram abolidos.Tambem houve um relógio e uma praça de automóveis. O prefeito França modificou tudo,deu o aspecto que tem hoje.
Ali foi o ponto dos desocupados faladorores da política e da vida alheia, como morei na General Osório tinha que passar por ali ligeiro pra não escutar piadas. Passei 2 anos ouvindo o barulho das máquinas derrubar casas antigas para a construção do Viaduto Damásio França.Isso tudo já foi descrito por nossos conterrâneos.
Juarez da Gama…