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TURISMO & HISTÓRIA

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Foto do escritorThomas Bruno Oliveira

Lembranças das prévias juninas

Atualizado: 30 de jun. de 2020

Para Suênia Bandeira

Céu do Parque do Povo enfeitado de bandeirolas

Era três em ponto. Antevéspera de São João. Era dia do último ensaio da quadrilha junina que costumeiramente se realizava na sede da Sociedade de Amigos do Bairro. Ele ia com um misto de nervosismo e tristeza; o que ocorria é que segundo seus conceitos, o momento mais delicioso de todo o processo junino não era a tão esperada noite de apresentação, que ocorria na noite da véspera de São João, mas sim os ensaios.


Na flor de seus treze anos, adorava o verdadeiro buchicho que havia naqueles treinamentos das tardes na SAB, religiosamente às segundas, quartas e sextas-feiras, a partir do início de abril. Aproximadamente uma hora e meia, as vezes mais, as vezes menos; dependia da complexidade do passo que seria ensaiado naquele dia. O subúrbio da cidade era repleto dessas quadrilhas, o estilo tipicamente matuto era regra, longe das estilizações e espetáculos que existem atualmente. Até porque as roupas variavam, isso proporcionava que alguns meninos e meninas pudessem exibir vestes mais humildes, não perdendo o direito sagrado de dançar. Eram duas as apresentações, uma no dia escolhido pela direção, neste caso dia vinte e três de junho (véspera de São João), e a outra se dava num ‘quadrilhão’ de domingo organizado na quadra da SAB, evento que reunia outras quadrilhas de vários bairros e até de municípios vizinhos. Vez por outra aparecia alguns vereadores e até o Prefeito da cidade dava o ar da graça, bordando as bochechas e o colarinho com o batom dos beijinhos das fãs.


Quadrilha 'Papa essa negada' em Bodocongó (C.Grande-PB). Ao centro, a diretora e puxadora Suênia Bandeira

No ensaio, entre os “alavantus e anarriês”, ele flertava uns cheiros no cangote das meninas, as que deixavam, claro. “Olha a cestinha de flores!”, chance única de pôr a mão na cintura da dama. O flerte era certo e quase sempre um namorico movimentava o pós ensaio, passando pelo crepúsculo indo até o início da noite, pois aquela era a hora limite para os passistas darem satisfação a seus pais.


Entretanto, o “enxerimento” não era para todos e os mais favorecidos eram os que exibiam maior beleza e eram mais cheirosos (no conceito das garotas) e elas pareciam ter uma conexão que, em plenos anos 1990, talvez não fosse tão intensa como as atuais redes sociais. É que, sem tanto ciúme, comentavam entre si sobre os garotos e aqueles que tinham melhor desempenho angariavam uma insuspeita concorrência de meninas e as paqueras aconteciam nos ensaios que se seguiam. Quando rolava um “ciuminho”, “foi não foi” se emplacava um namoro. Casualmente um daqueles casaizinhos se encontravam em outro dia, no fim de semana, isso se os pais deixassem.


Como todos tinham aproximadamente a mesma idade e os tempos eram muito menos “adiantados”, os namoricos eram o que havia de melhor: beijos, abraços e algumas juras de amor. Coisa de recém adolescente! Apesar de, alguns desses casais contraírem matrimônio anos adiante.


E naquele último ensaio, todo o desfile era reproduzido, um clima de despedida tomava conta do ar. A ansiedade da dona e ‘puxadora’ da quadrilha fazia brilhar seus olhos e a preocupação com um eventual errinho aqui, outro acolá, causava apreensão. No fim a despedida, a sensação era do último beijo, do último abraço, parece que todos não se veriam nunca mais, apesar de estar no mesmo bairro, estudar em escola semelhante... É que nos dois meses e meio de ensaio, aqueles jovenzinhos pareciam adentrar em um mundo mágico, onde era permitido quase tudo, inclusive namorar. A única obediência era a dona da quadrilha, em um território que não pertencia a família nem aos pais. Como era boa aquela sensação! Agora só ano que vem. O ensaio se vai e com o último crepúsculo, o último beijo. – Até amanhã pessoal! Lembrem-se de não comer muito para não termos problemas, dizia a dona da quadrilha.


Na tarde do dia seguinte, os garotos iam até a casa da quadrilheira cumprir o último ritual antes do desfile, ir atrás de palhas de coqueiro e palmeira nos monturos e ajudar os mais velhos na pintura do calçamento, marcando os lugares, as linhas dos “alavantus e anarriês”, o isolamento do público, os arcos de entrada e saída, a marcação para os fogos e carro de som, as bandeirolas e balões de poste a poste, e por volta das 16h, com a rua isolada para o trânsito, estava pronto o cenário esperando a festa. Hora de ir para casa tomar banho e se arrumar. A partir de então, a ansiedade era evidente n’um frio na barriga e um embrulho nauseante. O medo de errar, de tropeçar... Na plateia, familiares e a vizinhança do bairro. A noite de São João é estrelada, a quadrilha vai entrar: Vamos nessa. Viva São João!



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1 Comment


paulaw_oliveiraa
paulaw_oliveiraa
Jun 26, 2020

Que lembrança maravilhosa. Consegui visualizar muito do que você sentia na época.

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O começo

Durante anos temos viajado por diversos lugares para o desempenho de pesquisas e também para o deleite do turismo de aventura. Como um observador do cotidiano, das potencialidades dos lugares e das pessoas, tenho escrito muitas dessas experiências de centros urbanos como também de suas serras, montanhas e rios. Isso ocasionou a inspiração de algumas pessoas na ajuda em dicas de viagem.
Em 2005, iniciamos uma série de crônicas e artigos no Jornal Diário da Borborema, em Campina Grande-PB e após anos, assino coluna nos jornais A União e no Contraponto. Com o compartilhamento das crônicas, amigos me encorajaram e finalmente decidi entrar nas redes.
Aqui estão minhas opiniões, paixões, meus pensamentos e questionamentos sobre os lugares e cotidiano. Fundei o Turismo & História com a missão de ser uma janela onde seja possível tocar as pessoas e mostrar um mundo que quase não se vê, num jornalismo literário que fuja do habitual. Aceita o desafio? Vamos lá!

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