POR ONDE TENHO ANDADO, a primavera não tem dado o ar da graça, pelo menos os indícios de que está às portas. O desequilíbrio acentuado e as mudanças no meio ambiente certamente devem ter modificado sensivelmente a vida do planeta e vivemos todos os reflexos desse cenário que acaba por transformar o comportamento da natureza. No semiárido, por esses dias, já tínhamos um potente início das floradas. Pelo menos entre o alto da Borborema e a região do alto sertão parahybano não se tem sequer convivido com o majestoso amarelo e rosa dos inúmeros ipês e paus d’arcos que enfeitam e alegram os pés de serra que encontramos no enlevo da paisagem. Tive notícias de amigos que os Cariris Velhos ainda não explodiram em amarelo, assim como no agreste. Em Sousa, Uiraúna e São João do Rio do Peixe é que vi Juremas florindo, o prenúncio de uma de suas conhecidas consequências, a temporada de gripe devido ao pólen que rapidamente baila no ar até as vias respiratórias. Me disse o amigo sertanejo Luiz Carlos Gomes:
– Thomas, pergunte a qualquer sertanejo nativo quando é o tempo de gripe no sertão que lhe dirão que é quando a jurema está florando.
Sábias palavras de quem tem extrema sensibilidade em observar o comportamento da natureza.
Me pergunto onde estão os flamboyants, os jasmins? Nem mesmo as chananas (branquinhas) e jitiranas (roxas) que dão cor aos matos que crescem vadios nos terrenos baldios estão por aí. No meu Cariri particular, meu pequeno jardim, a flor do deserto não desabrochou. O buquê de noiva também não. Nenhuma cactácea deu sinais multicores. Sinceramente, estou ansioso. Chegou setembro e o que mais espero são os sinais, é ser tomado pela leveza da primavera, é curtir esse momento de passagem entre o inverno com seu friorento agosto e “a boa nova andar nos campos” com o sol de primavera cantado por Beto Guedes.
Setembro entrou, já estamos no dia 21 e mais parece que agosto ainda não terminou. Vem-me à mente uma frase enigmática do amigo brejeiro José Nunes: “carrego a primavera comigo” em crônica (A Primavera e a Musa) escrita para este prestigioso jornal A União. Onde estão os ipês amarelos enfileirados na avenida Floriano Peixoto do contorno da Dinamérica até os limites do centro da cidade? Nos últimos dias, o que me resta é contemplar a trepadeira lenhosa Bougainvillea de Dona Rilene, minha vizinha bem defronte a minha casa. Sempre ao sair e ao chegar, eu saúdo essa planta colorida, mesmo sabendo que o que parecem flores rosas, são na verdade folhas modificadas com cores bem chamativas com a função de atrair os polinizadores, dando a ideia de que são pétalas. Sábia natureza...
Notaram como as manhãs e as noites estão bem mais frias? Os que praticam a caminhada pela manhã estão se deparando com temperaturas menores que 20 ºC e o vento gélido baixa ainda mais a sensação térmica. O alto serrano da Borborema costuma conservar uma frieza nos extremos do dia, mas esse ano tem algo de diferente.
Melancólico e sorumbático, peito apertado, recebo pelo correio o livro ‘Pontes, céus e miragens’ (Patriani, 2024), do amigo Paulo Atzingen. Por acaso paro na página 100 em que ele majestosamente escreve em visita que faz a Santiago, no outro lado dos Andes: “Sobre elas [as cordilheiras] salpico várias pitadas de neve eterna e puxo o sol de primavera para iluminá-las à tardinha”. Ah Paulo, a primavera não chegou, mas chegaste em boa hora.
Leia, curta, comente e compartilhe com quem você mais gosta!
Publicado na coluna 'Crônica em destaque' do Jornal A UNIÃO em 26 de setembro de 2024.
Pois é professor Thomas, o homem só destrói aquilo que não conhece! Por isso ele tanto mexe com a mãe natureza , não lembrando que existe a Lei de Causa e Efeito.